- Publicidade -

Meu último encontro com Chorão, líder do Charlie Brown Jr., que faria 55 anos neste 9 de abril

Vocalista da banda de Santos foi encontrado morto em seu apartamento na capital paulista após overdose de cocaína em março de 2013

Chorão (esq.), vocalista do Charlie Brown Jr., e Steve Harwell, líder do Smash Mouth, no camarim após o show na antiga Via Funchal, em São Paulo | Amon Borges - 20.mai.2012/Portal Lineup
Chorão (esq.), vocalista do Charlie Brown Jr., e Steve Harwell, líder do Smash Mouth, no camarim após o show na antiga Via Funchal, em São Paulo | Amon Borges - 20.mai.2012/Portal Lineup

A lembrança ainda pulsa vívida na memória, como um riff potente que ecoa através do tempo. Era maio de 2012, e eu, Amon Borges, estava na antiga Via Funchal, em São Paulo, para conferir o show dos californianos do Smash Mouth. A noite daquele domingo, 20 de maio, seguia animada, embalada pelos hits que marcaram a adolescência de muita gente, quando uma energia familiar começou a emanar da lateral do palco. Era ele, Chorão, com a inconfundível aura transgressora e o sorriso meio de canto que sempre acendia uma faísca no público.

Acompanhado dos integrantes do Charlie Brown Jr., como Champignon, Chorão e cia. não estavam ali apenas para prestigiar os colegas gringos. Em um golpe de mestre, tipicamente “Charlie Brown” de ser, a banda de Santos invadiu o palco ao fim da apresentação do Smash Mouth, não apenas para um encontro de camaradagem, mas para anunciar uma colaboração inédita na gravação de novas músicas. Ali, naquele palco improvisado de encontros musicais, selava-se uma união improvável, mas carregada de potencial.

Leia também:

“Eu nasci em São Paulo, lotei essa casa várias vezes e acho que fui bem recebido pelo público deles”, disse-me Chorão no camarim após o show, com aquele jeito direto e sincero que cativava. Naquela noite, mesmo dividindo o palco com uma banda internacional, a conexão com o público paulistano era palpável, um reconhecimento mútuo de trajetórias musicais intensas. E, claro, não poderia faltar a sua arte visceral: em meio à surpresa geral, ele mandou umas rimas de improviso e relembrou hits que se tornaram hinos de uma geração, como “Tudo o que Ela Gosta de Escutar”.

Nesta quarta, 9 de abril de 2025, data em que ele completaria 55 anos, a memória daquela noite ganha contornos ainda mais fortes, carregada da saudade de um artista único e da tristeza pela sua partida precoce. Relembro a camaradagem com os integrantes do Smash Mouth, liderados pelo vocalista Steve Harwell —que morreu em 4 de setembro de 2023, vítima de insuficiência hepática—, e que haviam se conhecido no festival Lupaluna, em Curitiba, no dia anterior. “A gente tocou e ficou para assistir ao show deles na sequência. Eles são tão ‘sangue bom’ que ficamos amigos”, contou Chorão, naquela ocasião, sobre a gênese da inesperada parceria. “Aí conversamos e combinamos de fazer um som juntos”, completou, materializando a espontaneidade que guiava suas ações.

Os planos para a colaboração eram ambiciosos, como me revelou o líder do Smash Mouth, Steve Harwell: a intenção era criar um EP com cinco ou seis músicas, com a possibilidade de integrarem os próximos álbuns de ambas as bandas. A ideia era que o Charlie Brown Jr. viajasse até Nashville, nos Estados Unidos, onde o Smash Mouth residia, para as gravações. Aquele intercâmbio musical prometia ser uma ponte entre o rock californiano e a energia inconfundível da banda do litoral paulista.

Naquele momento de euforia e planos futuros, não faltou o humor característico de Chorão. “Antes nós precisamos falar com o Obama, porque eu não tenho o visto ainda”, brincou, com a leveza que contrastava com a intensidade de suas letras e performances. Ele mencionou, inclusive, que já tinha uma entrevista agendada para a obtenção do documento, mostrando a sua disposição em concretizar a parceria.

Além dos contatos profissionais, perdi as contas de quantas apresentações do Charlie Brown presenciei desde o início da adolescência, ainda no começo dos anos 2000. Aquele encontro inesperado na Via Funchal foi o meu último contato direto com Chorão. Uma perda trágica que abalou o cenário musical brasileiro ocorreu pouco tempo depois, em 6 de março de 2013, quando Alexandre Magno Abrão, nome de batismo, foi encontrado morto em seu apartamento em Pinheiros, São Paulo. O laudo necroscópico revelou que a causa da morte foi overdose de cocaína.

Hoje, a ausência de Chorão é uma lacuna imensurável na música brasileira. Mas a lembrança daquele encontro fortuito, da sua energia contagiante e da sua paixão pela música permanecem vivas. Naquele palco da Via Funchal, em meio à surpresa e à promessa de uma parceria que o tempo não permitiu concretizar da forma como imaginávamos, ficou gravada a intensidade de de um grande artista.

Compartilhe essa postagem:
- Publicidade -
Leia Mais
- Publicidade -
- Publicidade -